A Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro censurou na sexta (28) a exposição “Todxs xs Santxs – Renomeado – #eunãosoudespesa”, do artista Órion Lalli, que estava em cartaz no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica. O argumento do órgão da prefeitura é que uma das obras ataca valores cristãos.
Um dos trabalhos expostos continha a imagem de uma santa com o seio nu e um pênis à mostra, centrada em um esquema de quebra-cabeça mostrando dois homens nus se acariciando. Ao lado do jogo de imagens, aparece a frase “Deus acima de tudo, gozando acima de todos”.
A polêmica começou quando o deputado estadual Márcio Gualberto, do PSL, criticou a obra nas redes sociais.
Segundo Gualberto, ele recebeu uma denúncia anônima sobre a exposição. “É uma agressão desnecessária, injustificada e gratuita. O autor foi muito infeliz. Peço a Deus que toque o coração e o faça compreender que não produziu uma obra de arte”, disse o parlamentar.
Após críticas, Gualberto e a deputada federal Christiane Tonietto, do PSL, registraram uma notícia-crime na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância.
“É inadmissível que Nossa Senhora seja retratada com um órgão sexual masculino. Isso não é arte!”, disse o deputado em um tuíte.
Em nota, a secretaria da Cultura diz reafirmar “seu compromisso com o respeito constitucional à liberdade religiosa e a todas as crenças” e que “nossos equipamentos abrigam manifestações culturais de todas as linguagens e estilos, sendo um dos nossos pilares o respeito à liberdade artística”, mas informa que decidiu censurar a mostra enquanto aguarda a decisão judicial em relação à notícia-crime.
Ainda de acordo com a Secretaria Municipal de Cultura, uma comissão do órgão recomendou que a exposição tivesse classificação indicativa de 18 anos. Avisos foram então afixados nas galerias avisando sobre conteúdo impróprio para menores de idade uma semana antes da interdição da mostra.
O artista Órion Lalli, contudo, nega referências à Virgem Maria. “Estão dizendo que é a imagem de uma santa cristã, mas não é. É a minha santa. É o meu oratório”, afirmou Lalli. Segundo ele, a obra retrata diversos símbolos de diferentes signos, sobretudo ligados aos corpos LGBT e às pessoas soropositivas.
“Precisamos falar sobre meu corpo que vive com HIV, contextos históricos da arte, dadaísmo, futurismo e expressões artísticas muito mais velhas do que esses que querem me acusar de algo, de um crime, que não cometi”, acrescentou.
No dia 23 de fevereiro, a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro publicou um vídeo em que o secretário da pasta, Adolpho Konder, alerta que apesar de o Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica estar fechado devido ao recesso de Carnaval, o artista da obra seria notificado sobre as denúncias de vilipêndio e que uma medida seria tomada.
“Gostaria de salientar que a Secretaria Municipal de Cultura abriga as mais diversas expressões culturais e artísticas, mas não podemos admitir nada que promova intolerância e ofensa ao sentimento religioso de qualquer credo. Essa exposição foi aprovada por um curador na gestão anterior à nossa”, afirmou Konder.
O artista nega ter tido intenções de ofender alguém ou alguma fé. “Até quando vamos falar em sexo pautado no conservadorismo por um erro de construção mitológica?”, questionou Lalli. “Um trabalho como esse ser censurado mostra que a discussão está muito longe de ter uma razoabilidade. Que temos muito caminho pela frente”, disse.